A Confissão


No carro, voltando para casa, ele jurava para si mesmo: De hoje não pode passar. Fazia tempo que queria contar tudo para ela, mas tinha medo. Medo não só da reação dela, mas medo de si mesmo, medo de ficar sozinho.


Na primeira vez, prometeu para si mesmo que não aconteceria de novo. Foi só uma experiência, uma aventura, parte da crise de meia-idade. Mas lá estava ele de novo voltando de mais um encontro noturno secreto. E em casa a mulher a quem um dia prometeu fidelidade o esperava.


Deixar a esposa estava fora de questão, implicaria deixar todo um estilo de vida, do qual ele até gostava. Não poderia deixar aquele bairro, aquela casa, seus amigos casados e o futebol de domingo, as conversas sobre como filhos dão trabalho, levar os filhos na escola, não poderia perder o beijo de boa noite de seu caçula. Mas existia esse sentimento que o corroia por dentro e que fazia com que tivesse raiva ao olhar para sua mulher. Como ela não percebia que algo havia mudado? Como viver com esse peso de ser o vilão da história? Como deixar de amar minha esposa?


Chegou em casa e, enquanto a esposa estava na cozinha, o filho mais velho estava na sala ao telefone. “Desliga você primeiro.” Jovens e suas juras de amor eterno. – Pensou. Como era boa essa época em que se prometia para a namorada nadar todo um oceano só para ficar com ela. E agora ele se via ali, incapaz de não trair. Porque tudo o que precisava fazer era não trair, não olhar para a secretária no escritório nem para as meninas de biquíni na praia, não beber tanto, não dar ouvidos a amigos machistas, cumprir seu juramento. Agora era tão difícil. Deu um beijo na bochecha dela e foi tomar banho.


A água fria caía e ele continuava a jurar para si mesmo que tudo acabaria hoje. Contaria toda a verdade e depois imploraria por perdão. O importante era tirar aquele peso da consciência. Sentia a cabeça pesada, um pouco tonto. Quase tremia de tanto medo. E se ela não perdoasse? E se ela o mandasse embora na mesma noite? E se ele perdesse todos aqueles anos de casamento feliz? E pensava em milhões de castigos físicos que poderiam ser melhores que isso. E concluía: Ela me ama, me perdoa.


Sua única certeza era do amor, não só dela por ele, mas também dele por ela. E, se não fosse o amor, não estaria querendo contar a verdade. Se não fosse o amor, continuaria mentindo. E, se não fosse o amor, mesmo que ela desconfiasse ou até que descobrisse, negaria tudo. Mas o amor estava lá. E ele confessaria.


Quando saiu do banheiro, o filho já tinha deixado o telefone e ido dormir, e a mulher apagava a luz da cozinha e se dirigia para o quarto. Era agora. Deitou-se ao lado dela. Abraçou-a, beijou seu ombro. Suspirou fundo, ia falar.


- Querido, eu sei. – Ela disse.


E foi então que ele percebeu que ela também tinha medo.

2 Recados:

Diogo disse...

Se não lava as mãos é sujo, se lava gasta água.

Medo e indecisão são duas coisas diferentes; o grande problema, a meu ver,é quando as duas coisas se misturam no mesmo sentimento.

Click disse...

Você não é mole não, hein, moça!